10 coisas que aprendi com Terry Pratchett

É meio irônico que um de meus ídolos e autor favorito, Terry Pratchett, tenha falecido no ano em que publicarei meu primeiro livro. Ele foi a inspiração para eu começar a escrever. Se a vida é engraçada, como dizem, a morte é uma daquelas conhecidas chatas, que você encontra em uma festa e nunca sabem quando parar de contar piadas de gosto duvidoso.

Há 13 anos, conheci a voz de Pratchett. Desde aquele dia, jamais parei de ler sua obra. Jamais deixei de aprender e me inspirar com ele. O nome Pequenos Deuses (antigo nome do site) é uma pequena homenagem ao gênio e a um de seus livros que mais gostei, Small Gods.

Aqui estão algumas lições que esse cavalheiro e cavaleiro me ensinou.

Não pense nisso como a morte. Pense em como sair mais cedo para evitar o trânsito.

—Belas Maldições

1) Não se leve tão a sério. Pratchett começou a carreira fazendo sátiras de ficção fantástica. E ficou mundialmente conhecido por isso. Ele brincou com religião, política, imprensa, esportes, segurança pública, arquétipos da literatura, feminismo, racismo, nacionalismo, filosofia e quase tudo que se possa imaginar. Ele fez piada até mesmo com o seu diagnóstico de Alzheimer. Saiba encontrar graça onde parece não haver nenhuma. A vida fica mais divertida.

Dizem que você vê flashes da sua vida no instante antes de morrer. É verdade. Isso se chama viver.

—The Last Continent

2) Não se preocupe em vender. Preocupe-se em fazer o que gosta. A Cor da Magia foi publicado em 1983, para um mercado praticamente inexistente – naquela época, não se falava em romances satirizando fantasia. Ele praticamente inventou o nicho. Será que crianças gostariam desse gênero? Será que elas entenderiam as piadas sutis? Em 2001, Pratchett ganhou a Carnegie Medal em Literatura por Fabuloso Maurício e seus Roedores Letrados, primeiro título de Discworld voltado para crianças. Não importa o mercado. Não importa a crítica. Não importa a moda. Faça o que ama e se dedique a isso. O resto se encaixa.

Se você confiar em si mesmo... e acreditar em seus sonhose seguir sua estrela... você ainda vai ser derrotado por pessoas que passaram o tempo se esforçando, aprendendo coisas e que não foram tão preguiçosas.

—Os Pequenos Homens Livres

3) Não há regras. Não há nenhuma Gestapo da literatura controlando o que você pode escrever ou não. Ignore quem vomita regras. “Fantasia com mistério com Lovecraft com masoquismo com velho oeste com cristianismo? Esqueça! Nunca vai dar certo! É impossível!”. Você faz as regras.

Se você ignorar as regras, as pessoas vão reescrevê-las para que não se apliquem à você.

—Direitos Iguais, Rituais Iguais.

4) Se procurar por uma desculpa, vai achar. Sempre há motivo para deixarmos de perseguir nossos sonhos. Falta de tempo, de vontade, de conhecimento, de ajuda. Pratchett sabia disso e jamais sucumbiu à tentação da mania de desistir.

  • Como disse no número 2, ele teve A Cor da Magia publicada em uma época praticamente sem mercado e ganhou a Carnegie Medal em Literatura por Fabuloso Maurício.
  • Em 2007, foi diagnosticado com um tipo raro de Alzheimer. Escreveu mais 14 livros e produziu 2 documentários depois disso.
  • Em 2009, recebeu o título de Cavaleiro por seus serviços na literatura.
  • Quando ficou impossibilitado de digitar por causa da doença, continuou escrevendo com software de reconhecimento de voz ou ditando para seu assistente.
  • Em 2010, recebeu o World Fantasy Award for Life Achievement, prêmio dedicado a artistas com contribuições proeminentes no campo da fantasia.
  • Em 2011, Snuff, o 39º título da série Discworld, vendeu 55 mil cópias nos primeiros três dias.
  • Mesmo em 2014, com o Alzheimer em estágio avançado, continuou escrevendo e fazendo pouco da iminência da morte.

Terry Pratchett continuou fazendo o que amava até estar fisicamente impossibilitado de continuar. Sempre há desculpas. Estão todas em nossa cabeça.

Era muito mais fácil colocar a culpa sobre Eles. Era deprimente demais pensar que Nós somos Eles. Se foram Eles, então nada foi culpa de ninguém. Se fomos Nós, o que é que isso faz de Mim? Afinal de contas, Eu sou um de Nós. Tenho que ser. Eu certamente nunca pensei em mim como um Deles. Ninguém nunca pensa em si como um Deles. Somos sempre um de Nós. São Eles que fazem as coisas ruins.

—Jingo

5) Aprecie seus leitores. Pratchett passava horas autografando suas obras para os fãs. Era conhecido por não repetir as dedicatórias, fazer desenhos e escrever piadas nos livros. A humildade sempre nos leva longe. Ele sabia que seu sucesso se devia aos fãs, também. Nunca perca a atenção, a simpatia de deixar seu fã sentindo-se um amigo.

Sempre se lembre de que a multidão aplaudindo sua coroação é a mesma que aplaudirá a sua decapitação. As pessoas gostam de um show.

—Going Postal

6) O ceticismo faz bem. Te ajuda a pensar e a duvidar do que tentam colocar na sua cabeça à força. Desconfie do “porque sim”. Abrace o “por que?”.

Ver, ao contrário da crença popular, não é crer. É onde a crença termina, porque não é mais necessária.

—Pirâmides

7) Um pouco de raiva faz bem. Como Neil Gaiman disse sobre Pratchett, ele não era fofinho, era zangado. Tinha raiva de muitas coisas – racismo, intolerância, opressão, do Alzheimer, que estava tirando tudo dele muito cedo, da injustiça de não poder escolher quando partir. Todos temos raiva de alguma coisa. Use essa fúria vermelha dentro de você para te impelir rumo aos seus sonhos, para obliterar os obstáculos, para ignorar o que não te ajuda e não acrescenta.

Faça uma fogueira para um homem, e ele se aquece por um dia. Ateie fogo em um homem, e ele se aquece para o resto da vida.

—Jingo

8) Se estiver ofendendo alguém, provavelmente está fazendo a coisa certa. As pessoas se ofendem por literalmente qualquer coisa. Principalmente com quem faz sucesso. É muito mais fácil criticar do que correr atrás e realizar seus desejos. Obviamente, isso não te dá o direito de ser babaca e deliberadamente detestável.

Não vale a pena fazer algo a menos que alguém, em algum lugar, preferisse que você não o fizesse.

—Terry Pratchett

9) Não há justiça. Só há a morte. Preocupe-se com a vida. Faça o que gosta, passe tempo com quem ama, fale sobre coisas que o divirta. Se fizermos nossa parte, o melhor que pudermos, nos esforçarmos, nos dedicarmos à nossa paixão… tudo ainda pode dar errado. Mas, com um pouco de sorte, ficaremos bem.

‘NÃO HÁ JUSTIÇA’, disse Morte. ‘APENAS EU.’

—O Aprendiz de Morte

10) A morte não é fim. Quando o corpo perece, seu trabalho, sua influência, as consequências dos seus atos, as vidas que continuam tocadas por você ainda existem. Essa é a verdadeira imortalidade. Suas ideias podem viver para sempre.

Uma pessoa só morre realmente quando a agitação que causou no mundo se acaba. A duração da vida de alguém é apenas o núcleo de sua existência.

—O Senhor da Foice.

 

Obrigado pelas memórias, risadas e por tornar o mundo um pouquinho melhor. Você enriqueceu minha vida.

Este post tem um comentário

  1. Luciana Darce

    Entendo bem seu ponto, Thiago. Engraçado que por onde eu circulo, muita gente conhecia ele de nome – nem que fosse pelo fato de que eu falava dele pra cima e para baixo sem parar. Apresentei muitos dos meus amigos à sua obra e fiz outros tantos amigos por causa dele. Engraçado que lendo os depoimentos das pessoas sobre o Pratchett, a impressão que fica é o senso de comunidade, a forma como ele nos influenciou a todos. Excelente o seu texto também! Tudo isso aprendemos com Pratchett e mais. Grande abraço!

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